domingo, 20 de março de 2011

CAMINHANDO PARA A CATÁSTROFE

EDU DALLARTE
Entrevista com a geofísica Leuren Moret

Via Inacreditável


Caminhando pacificamente para a catástrofe



Leuren Moret é uma geofísica, cientista independente e especialista internacional sobre radiação e saúde pública. Ela se ocupou intensivamente em esclarecer a população sobre as características devastadoras das munições com urânio utilizadas em guerras pelos EUA, países da OTAN e Israel. Em suas palestras, ela informa as mídias e discute com parlamentares e deputados. Ela escreveu uma dissertação baseada em suas pesquisas sobre a poeira na atmosfera e como ela é transportada por todo o mundo. Ela mostrou como a poluição do meio-ambiente em forma de poeira pode se deslocar em menos de uma semana da Ásia para a América do Norte. Ela disse que dentro de uma perspectiva global, a natureza é uma só. Aquilo que escapa de um país, em algum momento vai parar em outro, indiferente das “barreiras” continentais ou oceânicas.


Leuren Moret, geofísica

Leuren Moret atuou também como atriz principal no filme “Blowin’ in the Wind” do famoso produtor de documentários David Bradbury, duas vezes nomeado ao Oscar. O filme denuncia o tratado secreto que permite ao militares norte-americanos testarem suas munições de urânio na Austrália, assim como treinarem seus soldados. Ele mostra também as terríveis deformações em recém-nascidos no Iraque. Além disso são reveladas as mentiras do governo britânico sobre seus testes atômicos realizados na Austrália. O filme chocou, revoltou e surpreendeu muitos telespectadores nas mostras de cinema em Sidney e Brisbane.

Pergunta: Você poderia nos contar resumidamente sua experiência na área de emissão radioativa?

Moret: Eu trabalhei em dois laboratórios para armas atômicas. Fui ensinada por Marion Falk, um cientista do Projeto Manhattan que desenvolveu no laboratório Lawrence Livermore, entre outros, a bomba de hidrogênio. Eu pesquisei os efeitos dos testes atômicos sobre a população norte-americana e outros grupos, nas redes de pesca nos oceanos e também o efeito de usinas nucleares.

Pergunta: Você acha que a população mundial está em risco devido aos acontecimentos nas usinas atômicas japonesas?

Moret: Baseado na minha experiência e naquela dos principais pesquisadores na área de radiação e ciência geral, nós estamos muito preocupados com a situação no Japão.

Pergunta: Mais claro impossível. Como você e seu grupo vêem o futuro desenrolar? O que acontecerá a seguir?

Moret: Eu posso lhe dizer, nós todos estamos receosos. A radioatividade já se espalhou. Dois contatos que tenho no Japão e são cientes da situação, já fugiram com suas famílias para Okinawa (cidade no extremo sul japonês). Todo o hemisfério norte está em risco. Isso é devido à circulação do ar em torno do planeta. Neste contexto, a Linha do Equador forma uma barreira. Se o hemisfério norte for exposto à radioatividade, esta se movimenta em diferentes direções segundo a altitude. As correntes de jato (jetstream) são uma forma efetiva para transportar partículas radioativas a grandes distâncias, movimentando o ar do oeste para leste praticamente na mesma latitude. Foi assim que eu, por exemplo, mapeie tipos de doenças segundo as condições atmosféricas dos testes atômicos. Eu descobri que existe uma freqüência das mesmas doenças nas mesmas latitudes e um forte aumento desde 1945, o que nos remete aos testes atômicos.


Correntes de jato
confinam a radioatividade dentro de cada hemisfério

Pergunta: O governo japonês diz que eles tem sob controle a emissão radioativa. Você acredita nisso?

Moret: Eu não iria acreditar naquilo que um governo diz e especialmente naquilo que as concessionárias de energia dizem. Eu lidei com representantes do governo japonês, canadense e americano, e a maioria não diz a verdade. As afirmações mais verídicas provêm de certos cientistas, e também de certos ativistas que conheço ao redor do mundo. Pois eles estão no local, onde acontecem os experimentos, eles mesuram e observam a intensidade das emissões por todo o planeta. Eles estão muito preocupados com a situação no Japão e fornecem os melhores dados e informações.

Pergunta: Você utiliza a palavra “receoso”. É a palavra certa para a situação?

Moret: Eu creio que é a expressão correta, pois alguns dos cientistas da Rússia e Europa foram atingidos pessoalmente pela catástrofe em Chernobyl. Eu estava no campo de teste em Nevada, observei os efeitos dos testes atômicos sobre a população nativa, como a contaminação se espalhava sobre seu território. Eu estive por todo o globo e estudei as populações expostas à radiação. Eu conheço por isso muito bem os danos que podem ser causados pela emissão radioativa, melhor do que muitos especialistas entrevistados pela mídia e que expressam suas opiniões.

Pergunta: A intensidade das emissões não decai ao chegar através do pacífico até à costa da Califórnia?

Moret: Não, as partículas radioativas permanecem juntas como uma bolha. Quando chove, são atingidas a população e toda a região onde a chuva cai, e podem aparecer as mais diferentes doenças provocadas pela radiação. Esta contaminação atua sobre os genes e será transmitida às futuras gerações.

Mas isso não deve ser motivo de preocupação à população brasileira, pois como afirmou o ministro Mercadante: “O nosso reator é um pouco mais moderno. As paredes são mais robustas do que reator japonês e a nossa usina é capaz de aguentar tsunamis de até sete metros de altura e eventuais terremotos de 6,5 graus na escala Richter.”

Aparentemente o ministro desconhece o significado da palavra “acidente”. Uma vez que ele ocorra, quem deve ser responsabilizado pelas centenas de milhares de vidas destruídas pela radiação, além da contaminação de grandes regiões brasileiras? Sugerimos que os responsáveis pela aprovação da construção de usinas nucleares se comprometam, juntamente com todos seus descendentes, a serem os primeiros “voluntários” para os reparos e limpeza do nosso reator “mais moderno” e com paredes “mais robustas” – NR.

Pergunta: Soa muito mal. Onde você se encontra no momento?

Moret: Estou em Berkeley, Califórnia, do outro lado da baía de São Francisco.

Pergunta: Ou seja, diretamente à frente do Japão. Por que você está aí, achando que há risco?

Moret: Eu observo e mesuro os níveis de radiação. Se ele se alterar devido à Fukushima, eu dou meu alerta e depois desapareço.

Pergunta: Quanto tempo você calcula para que aconteça um GAU (catástrofe nuclear)?

Moret: A situação por lá se torna pior a cada dia que passa. Não existe mais um acesso direto às instalações, tudo deve ser levado por helicóptero, os geradores de energia foram destruídos pelo tsunami, os refrigeradores não funcionam mais. 90 minutos após o tsunami, quando o resfriamento cessou, iniciou-se o aquecimento das varetas de combustível nuclear. Partes destas varetas estão expostas completamente e começaram a derreter. Houve explosões de hidrogênio, incêndios, radioatividade alcançou o meio-ambiente, os índices de radioatividade em torno das instalações se elevaram a patamares perigosos. A qualquer momento pode acontecer o pior.

Pergunta: A única coisa positiva dos acontecimento no Japão é a mudança na Europa, no que concerne à limitação da energia atômica. Na Alemanha, foi decretado hoje uma moratória de três meses e determinado o desligamento provisório de 7 instalações nucleares, dentre as 17 existentes, para avaliação. O que você acha disso?

Moret: Seria uma atitude correta se fosse uma decisão permanente. Mas os defensores da energia atômica fazem agora apenas um recuo estratégico, e quando tudo passar e estiver esquecido, continuarão exatamente da mesma forma. Os políticos, em sua maioria, são comprados pelos conglomerados energéticos; aqui não se pode esperar grandes mudanças. Há muito dinheiro envolvido.

Pergunta: Grato pela entrevista, que eu gostaria de continuar amanhã devido à atualidade.

Moret: Com prazer.

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